sábado, 20 de junho de 2009

Rebeldes da língua

Folha de S. Paulo, 17/06/2009 - Ruy Castro

Abgar Renault (1901-1995), um dos nossos mais subestimados poetas modernos -não necessariamente "modernistas" -, nunca aderiu às reformas ortográficas de 1943 e 1971. Até morrer, escreveu belezas como

"Quando me sumo na total ausência
do curso opaco e ascetico do somno
e não estou em mais nenhum lugar,
mil invisiveis cousas mysteriosas
talvez ocorram sobre o chão, pelo ar".

E Abgar não era um amador excêntrico. Era filólogo, um profissional da língua. Seus textos em prosa e poemas aportavam nas editoras cheios de "yy" e "ph" e eram convertidos para a ortografia vigente. Ordens de cima, diziam.

Aqui no Brasil começam a surgir sintomas dessa desobediência. O escritor Reinaldo Moraes, autor do recém-lançado romance Pornopopéia, não abriu mão do acento nem no título. E o também recente Dicionário Amoroso da Língua Portuguesa, editado por Marcelo Moutinho e Jorge Reis-Sá, com contos, poemas e ensaios de autores de Brasil, Portugal, Angola, Moçambique e Timor Leste, é uma aula prática de unidade na diversidade.

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